1986-2022 – Os “quase quarenta” anos de “The Queen is Dead”.

Essa coluna foi escrita originalmente em 2006 e atualizei dada a importância do registro. O título na ocasião era “1986-2006 – Os vinte anos de “The Queen is Dead”'. Escrevi mais ou menos assim…

Sempre me perguntaram - e continuam me perguntando - o motivo de eu não escrever

sobre o “The Smiths”, já que todos sabem é minha banda predileta e sendo

assim, seria natural não é mesmo? Mas a resposta é simples!

Tamanho é o respeito e a admiração pela banda, que vou roubar uma

frase do vocalista Morrissey, para explicar o motivo. Certa vez, ele foi questionado sobre o

motivo de não ter escrito a letra para uma canção instrumental da banda, composta pelo

guitarrista Johnny Marr e disse ele:  "'Oscillate Wildly’ é uma canção perfeita, com harmonia

perfeita, e arranjos impecáveis. Qualquer coisa que eu pudesse escrever para colocar sobre a música não ficaria à altura”. Eu penso o mesmo sobre escrever sobre a banda. Porém, dadas as bandas atuais, o atual cenário da música, acho importante deixar um novo registro, ou na verdade, renovar o registro sobre o icônico álbum.

A ocasião pede e não me agüentei, tenho que tentar retratar de uma forma resumida, porém

contundente o motivo - ou - os motivos pelos quais você deve ouvir com atenção um dos álbuns mais importantes na história da banda e da música de um modo geral.

“The Queen is Dead” completará em breve quarenta anos (2026) e muitas coisas aconteceram nessas quatro décadas, ainda assim, “The Queen is Dead”, não é apenas um disco, são pensamentos profundos sobre o amor, o ódio, a indignação, a religião, a política, e tudo isso com uma pitada de humor em cada frase, talvez numa tentativa de suavizar o peso de cada palavra através desse “humor”.

Só para se ter uma idéia, o The Smiths conseguiram com a formação clássica do rock, baixo, bateria, guitarra e vocal, se firmar dentro de uma cena dominada pelos

sintetizadores, e todo o colorido da New Wave dos anos 80. 


Isso se deve porque Morrissey, o vocalista, tinha muito o que dizer e que com os arranjos e melodias perfeitas criadas por Johnny Marr, o guitarrista, se fizeram ser ouvidos. Por seu conteúdo, por sua música, por sua identidade visual. Afinal, ainda que com toda essa seriedade que Morrissey, Marr, Rourke e Joyce pregam em suas canções, o “The Smiths” estava longe de ser uma banda chata ou datada e  toca até hoje, mesmo no circuito comercial (FM, Web Rádio e mídia em geral) ao mesmo tempo que continua a ser reverenciada no circuito “underground” como uma das maiores e mais respeitadas bandas de todos os tempos.

Entenda um pouco mais sobre o que quero dizer nesse ‘faixa-a-faixa’ do álbum. Apenas não se esqueça: qualquer coisa que eu possa dizer não é nada se comparado a você mesmo ouvir o disco e tirar suas próprias conclusões.


1) “The Queen is Dead”

Faixa que abre o disco e não por acaso tem o mesmo nome.

Aqui, Morrissey já destilava seu veneno e retratava em 1986 que a Inglaterra já não era a mesma de outros tempos. Afundada em drogas, hipocrisia e com a família real sendo

sustentada pelo esforço de milhares de trabalhadores britânicos, Morrissey declarou para

alegria de todos que contestavam o papel da monarquia inglesa: “A Rainha Está Morta”.
Anos antes os Sex Pistols (cuja série “Pistols” no streaming é sensacional) já havia afrontado a monarquia, mas nunca declaradamente de forma explícita, ainda mais em um título de álbum. Por esse motivo, Morrissey chegou a ser interrogado pela polícia inglesa, o que não acabou dando maiores problemas ao cantor.

Nota: Fica aqui o registro de pesar pela passagem de Elizabeth II cujo teve em seu rol de mentores e amigos próximos, ninguém menos que Winston Churchill a quem o ocidente deve agradecer eternamente por ter nos libertado, nesse caso sim, do nazi-fascimo. Bom, mas o assunto é o álbum, vamos em frente.


2) “Frankly, Mr. Shankly”

A segunda faixa, traz a banda falando sobre fama, dinheiro e possivelmente o atrito entre os

Smiths e sua gravadora “Rough Trade”. Essa relação banda/gravadora soava mais atual vinte anos atrás, em tempos de descoberta e disseminação do mp3. Hoje ainda existem tais divergências, mas as mídias e contratos são muito diferentes de outrora, na ocasião Morrissey começa com tiro certeiro: “Francamente Sr. Shankly, esta é minha posição, ela compensa minha carreira, mas corrompe minha alma. Quero ir embora, você não vai sentir minha falta. Eu quero fazer parte da história da música”... Como sabemos, conseguiu!



3) “I know it's over”

Essa balada é inexplicável. É capaz que você consiga enxergar um fundo mais fundo ainda ao ouví-la, sobretudo quando se trata das coisas do coração, o trecho mais pesado em minha opinião é: “ O amor é natural e real mas não para pessoas como você e eu meu amor”. Ou ainda outro trecho que diz (de forma reduzida) “ Se você é tão engraçado, esperto, divertido e bonito – por que está sozinho hoje a noite?”. Em apenas duas frases de uma única canção, dá pra se ter um ideia da língua afiada de Morrissey quando diz no título “ Eu sei, isso é o fim”.


4) “Never had No One Ever”

Outra faixa onde Morrissey reclama o fato de nunca ter tido ninguém para amar, conversar ou enfim, vocês sabem. Clima sombrio e sussurros caracterizam essa faixa que não é nem de longe uma de minhas prediletas. Se você ouvir e tiver outra opinião a respeito, por favor me conte, juro que vou tentar ouvir de novo e analisar de outra forma ok?


5) “Cemetry Gates”

Uma música chamada “Portões do Cemitério” poderia ser divertida? Sim, claro que poderia!

Além de divertida, “Cemetry Gates” pode dar uma aula de literatura e poesia quando cita e


incita quem ouve, a querer saber quem são John Keats, W.B. Yeats e, talvez, o mais conhecido e ilustre personagem da canção, Oscar Wilde.

Aqui Morrissey se pergunta ao olhar uma das lápides: “ Todas aquelas pessoas, todas aquelas vidas, onde estarão elas agora?”. 

É também a canção que melhor enquadra a voz de Morrissey e a melodia de Marr. Sem dúvida uma das prediletas da casa.



6) “Bigmouth Strikes Again”

Uma das canções clássicas da banda. “O bocudo ataca de novo” traz versos poderosos como “Agora eu sei como Joana D’arc se sentiu, enquanto as chamas subiam por seu nariz romano e seu Walkman começava a derreter”. O que será que tocava no ‘Walkman’ de Joana D’arc quando a inquisição a queimou por engano? Sim, por engano, afinal 200 anos após ser colocada na fogueira, literalmente, pediram desculpas e a transformaram em Santa Joana D’arc. Isso mesmo, Joana D’arc é santa na França!


7) “The Boy With The Thorn in His Side”

Essa canção retrata o próprio Morrissey. Esse “Garoto atormentado” nada mais é do que ele

próprio, seu tormento fica claro quando ele diz: “E se eles não acreditarem em nós agora,

quando acreditrão?”. Hit máximo e absoluto da banda, “The boy...” dispensa comentários. É sucesso em qualquer festa e principalmente nas estradas da vida. Experimente ouvir essa música no carro, indo para qualquer lugar bacana. É demais!


8) “Vicar in a Tutu”

Essa é uma crítica sobre a forma como vivem algumas pessoas inescrupulosas que se

escondem na religião e assim pregam o bem, mas praticam o mal. De forma satírica, vemos aqui um ataque ao clero e questões controversas que deveríamos debater mais a fundo sobre religião, talvez outrora, não aqui nessa coluna. A ideia é que as músicas são subjetivas, portanto o que significa depende dos ouvidos de cada um e o próprio compositor deixa essa margem ao ouvinte em muitos casos. Esse é um deles.



9) There is a Light That Never Goes Out”


”Me leva pra sair essa noite, para onde exista música, pessoas jovens e cheias de vida”. Assim começa a minha canção predileta do álbum e talvez a minha canção predileta dos Smiths.

Enquanto o disco vai chegando ao fim, Morrissey nos deixa o recado de que “Há uma luz que nunca se apaga”. Em momentos difíceis, essa música foi uma das minhas melhores amigas e retrata bem o motivo pelo qual em muitos lugares no mundo, os Smiths são conhecidos como “A banda que salvou sua vida”. Ouça, se já ouviu, ouça de novo, e de novo, e de novo… and There’s a light that never goes out!



10) “Some Girls Are Bigger Than Others”

A canção que finaliza um dos melhores discos da história, não é um primor de letra, entretanto tem melodia gostosa, e ao ouvi-la não achamos ruim em cantar repetidamente o refrão que diz “Algumas Garotas são maiores que outras”. Seja no tamanho em si, ou no tamanho de sua popularidade ou de beleza adolescente, o fato é que essa canção se trata disso, das diferenças que existem entre adolescentes e não é deixando seus filhos debaixo de suas asas que escaparão da maldade do mundo.

Se isso tudo é apenas um disco, imagine o quanto mais você não conseguiria aprender

ouvindo música. Fique à vontade, diversos são os estilos, os assuntos e os ritmos. Os Smiths e todo o pessoal do Pós-Punk, tornaram minha vida mais interessante.

Se você parar para pensar, será que não existe algum estilo de som, alguma banda que

transforme a sua vida, que abra seus horizontes, que seja tão poderosa capaz de fazer com

que você não a troque pelo próximo hit do momento? Sei lá, é só uma dica!

Para saber mais:


Oscar Wilde: Grande escritor inglês, escreveu entre outros livros “O Retrato de Dorian Gray”, excelente, um clássico. Agora, se você procura algo mais ‘profundo’ posso indicar “De Profundis” do próprio escritor.

1986: Foi o ano de lançamento de “The Queen is Dead”, que seria o penúltimo disco da banda que acabaria no ano seguinte.

Morrissey: Canta em carreira solo e e sua extensa carreira solo é tão relevante quanto a dos Smiths. “Suedehead” é um de seus clássicos em carreira solo, sempre é confundida como se fosse uma canção da época dos Smiths.

2000: Ano em que Morrissey passou por aqui pela primeira vez com a turnê Oye Esteban! O show foi no extinto Olympia. Inesquecível! Eu ainda assistiria todas as outras vindas do vocalista dos Smiths, bem como a apresentação sensacional do Johnny Marr no Cultura Inglesa Festival. Tive ainda o prazer de uma ‘quase entrevista’ com o Andy Rourke, baixista da banda, quando o encontrei em sua passagem por São Paulo como dj (sim, tenho fotos). Da entrevista, restou um autógrafo no álbum (ou seria uma coletânea, dá uma coluna também). 


Ouça The Smiths e outros clássicos de igual tamanho e importância em nossa programação!

Bom, é isso! Espero que tenham gostado e até uma próxima “Sônico”!

www.risewebradio.com.br
#nascemosdiferentes




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